Regras da IMO pressionaram o setor marítimo a investir em tecnologias e infraestrutura para novos combustíveis

Regras da IMO pressionaram o setor marítimo a investir em tecnologias e infraestrutura para novos combustíveis

A indústria marítima global está se preparando para uma transformação de rumores às emissões líquidas zero (Net-Zero) que vai impactar todo o setor nos próximos 25 anos, desde a cadeia de suprimentos e modelos de negócios até navios, portos e força de trabalho a bordo. As novas regulamentações aprovadas em abril deste ano na Organização Marítima Internacional (IMO) para zerar as emissões dos navios estão previstas para serem cumpridas em outubro deste ano. Os apelos por investimentos em descarbonização estão se intensificando.

“Regulamentos sozinhos não resolvem. Precisamos de desenvolvimento tecnológico e de complemento alternativos (…) e isso só pode acontecer de uma maneira: com investimento”, declarou o secretário-geral da IMO, Arsenio Dominguez”, em junho, durante fórum sobre financiamento para a economia do mar, em Mônaco.

Esse desenvolvimento passa por investimentos para ampliar a produção de combustíveis alternativos em escala e volumes suficientes para substituir 350 milhões de toneladas de combustíveis fósseis (óleo combustível) queimados por navios todos os anos. Outro desafio é modernizar a infraestrutura dos portos e as operações de abastecimento de bunker para que possam ser oferecidas energia limpa e com segurança aos navios que atracam nos portos ao redor do mundo.

“É uma transformação completa do setor de navegação. Serão necessários ecossistemas para que isso aconteça em conjunto. (…) Será uma longa e difícil jornada, mas queremos estar na liderança”, disse no evento a vice-presidente executiva de navegação e logística da CMA CGM, Christine Cabau-Woehrel.

De acordo com o Conselho Mundial de Navegação (WSC), já existem, pelo menos, 200 linhas de longo curso com porta-contêineres em operação que podem trafegar próximo do Net-Zero ou totalmente sem emissões líquidas, enquanto cerca de 80% de todas as novas encomendas de navios de contêineres e embarcações de transporte de veículos deverão ter a mesma capacidade híbrida.

“O setor de transporte marítimo regular já investiu US$ 150 bilhões em descarbonização. É algo sem precedentes para o setor de transportes. (…) Mas precisamos do fornecimento dos combustíveis. (…) É uma tremenda oportunidade de investimento”, acrescenta o presidente da WSC, Joe Kramek.

O novo conjunto de regulamentações, chamado de “IMO Net-Zero Framework”, estabelece uma abordagem dupla: um padrão global de combustível que limita a intensidade de gases de efeito estufa (GEE) dos combustíveis marítimos e um preço definido para as emissões de GEE dos navios.

As regulamentações enviam um sinal claro de demanda para produtores de combustíveis, enquanto recompensam as empresas de navegação que são pioneiras no sentido de assumir o risco de adotar primeiras soluções de baixa emissão ou emissão zero, bem como aquelas que estão interessadas em compartilhar essas experiências com os demais players.

O negociador chefe da área de Green Shipping do Ministério do Clima e Meio Ambiente da Noruega, Sveinung Oftedal, acredita que é possível chegar a um consenso para a adoção das emendas às regras de descarbonização que assentam na pauta da sessão extraordinária do Comitê de Proteção do Meio Ambiente Marinho da Organização Marítima Internacional (MEPC/ES.2), em outubro. Será o desdobramento do MEPC 83 que, em abril, aprovou uma minuta que estabelece uma estrutura para emissões líquidas zero (IMO Net-Zero Framework) e a criação de um sistema global de precificação de emissões no transporte marítimo.

Ele avalia que muitas propostas vêm sendo apresentadas em todo esse processo, o que faz parte das longas jornadas nesse tipo de discussão. “Em outubro, a adoção final foi desejada. Houve várias propostas chegando. Alguns desses proponentes são a favor de uma solução. Outros podem aceitar uma solução. É assim em tudo, no início de um processo”, analisou Oftedal, que concedeu entrevista à Portos e Navios no edifício do ministério, em Oslo, na semana da 60ª Nor-Shipping.

Oftedal, que coordenou grande parte das reuniões nas sessões da IMO este ano, observa que todos os proponentes tinham em comum a disposição de chegar a um acordo, para atingir as ambições da estratégia. Ele considera natural nas negociações que cada um queira fazer valer sua proposta. “Como presidente, penso que todas as propostas são construtivas e preciso mostrar que estamos apresentando uma solução final”, disse.

Oftedal tem larga experiência nos projetos climáticos ligados ao transporte marítimo da IMO, que vem desde 1997, época em que foi adotado o anexo VI da Convenção sobre Prevenção da Poluição do Ar por Navios (Marpol) que, desde então, vem sendo ampliado para outras discussões. Ele considera que o acordo em 2017 para o desenvolvimento de estratégias amplas para mitigar GEE, com a definição em 2018, foi um ponto de virada para a agência das Nações Unidas, endereçando também as emissões totais para o transporte marítimo. O contexto desta transição foi estabelecido por meio de resolução.

A estrutura ‘Net Zero’ da IMO será incluída em um novo capítulo 5 do Anexo VI da Convenção Internacional da Marpol (Prevenção da poluição dos navios). Após a aprovação da minuta, em abril de 2025, as emendas propostas ao Anexo VI da Marpol foram distribuídas entre os 176 estados-membros da IMO. A previsão é que as emendas sejam adotadas em outubro, durante a sessão extraordinária do MEPC. A expectativa da IMO é que, durante o MEPC 84, em 2026, ocorra a aprovação das diretrizes de implementação planejadas para que entrem em vigor, em 2027, 16 meses após a adoção.

O Anexo VI tem atualmente 108 participantes que representam 97% da tonelagem da navegação mercante mundial, e já inclui requisitos obrigatórios de eficiência energética para navios. O objetivo é alcançar as metas climáticas previstas em 2023 na Estratégia da IMO para redução de gases de efeito estufa por navios, acelerar a introdução de combustíveis, tecnologias e fontes de energia com emissão zero ou próxima a zero de GEE e apoiar uma transição justa e equitativa.

Oftedal destaca que a decisão tomada em 2023, no sentido de rever a primeira estratégia de metas de descarbonização, foi importante por ser formada um consenso e por estabelecer um período de cinco anos para esse processo. Ele menciona o engajamento do Brasil, entre outros países, nesse debate. “A ambição Net Zero foi um marco para a IMO e temos vários checkpoints. Foram negociações extensas, onde o Brasil foi um player muito ativo e muito construtivo. E foi ótimo ver isso acontecer”, lembra. Segundo o presidente, foi interessante e útil trabalhar com o Brasil. “É bom que haja uma nação na América Latina e um país europeu trabalhando juntos, porque assim podemos analisar isso de vários ângulos”, acrescenta.

Para o chefe Norueguês das negociações junto com a IMO, a hora agora é de encontrar uma solução que garanta uma transição e que seja aceitável para todos os estados-membros. Ele afirma que o momento para a descarbonização do transporte marítimo é forte na Ásia, na Europa, na América Latina, na África, assim como no grupo que inclui pequenas ilhas (Pequenos Estados Insulares em Desenvolvimento – SIDS).

“Infelizmente, havia alguns membros relatando que não queriam vir juntos. O resultado do mundo foi claro e, agora, precisamos nos certificar que [o texto final] será adotado em outubro. Não é sobre a última reunião, é sobre construir um processo onde você estabelece confiança e onde você tem um plano e um prazo. Isso é parte de nos fazer chegar [a um acordo]”, conclui Oftedal.

Ele diz que a maioria dos estados-membros vem mantendo suas posições. Pondera que as diretrizes da IMO preveem que os navios, independente da bandeira, devem seguir os requisitos onde quer que estejam no mundo. Quando navios com bandeiras estrangeiras chegam a um porto, a autoridade marítima do país tem o direito de fiscalizar o cumprimento dos requisitos do país, assim como verificar os certificados. “É possível fazer mais inspeções e, até mesmo, aplicar avaliações. Esse sistema está pronto e funcionando muito bem”, pontua.

Os EUA fazem parte do Anexo VI da Marpol e, na prática, os navios que arvoram a bandeira do país também precisam atender a esses requisitos quando atracarem em portos de outros países. “Qual será a decisão dos EUA em relação a isso? Não sabemos, claro. Mas espero que eles também percebam que o comércio é importante, que o contexto internacional do trabalho marítimo é importante e que eles tenham uma carga chegando aos seus portos como antes. Isso não interromperá o comércio. Espero que eles percebam isso e façam parte da comunidade internacional para que isso aconteça”, comenta.

A plataforma Net-Zero da IMO trabalha em conjunto com medidas anteriores adotadas para aprimorar o projeto de navios com eficiência energética, melhorias operacionais e classificações de intensidade de carbono. Essas medidas serão revisadas a cada cinco anos, com limites de emissões mais rigorosos ao longo do tempo. O secretário-geral da IMO destaca que essas regulamentações são obrigatórias e devem ser aplicadas a todos os navios de transporte marítimo internacional, independentemente de suas bandeiras. 

A avaliação, segundo Dominguez, é que haverá um impacto no treinamento, com aproximadamente meio milhão de marítimos precisando de qualificação até 2030. Além disso, as medidas de segurança precisarão ser atualizadas de forma abrangente para garantir a utilização dos combustíveis de forma segura e eficiente.

Dominguez apela para que a comunidade internacional se concentre em ações concretas e na implementação de uma série de compromissos globais já acordados. “É hora de passarmos das declarações e compromissos para as ações. É o que fizemos na IMO há mais de uma década e o que vamos demonstrar novamente em outubro. E não vamos parar por aí”, ressaltou o secretário-geral da IMO. “A descarbonização tem um custo. Já gastamos dinheiro na poluição do meio ambiente. É hora de todos investirmos em limpá-lo e torná-lo sustentável para as futuras gerações”, reforça Dominguez.

No Brasil, o recém-aprovado decreto 12.555/2025, que regulamentou o programa BR do Mar, prevê incentivos de afretamento para empresas que utilizam navios ‘sustentáveis’ na cabotagem brasileira. O Ministério de Portos e Aeroportos (MPor) pretende publicar, nos próximos meses, uma portaria para definir as características dos navios sustentáveis, que darão condições especiais às empresas nas regras de tonelagem para o afretamento por intermédio do programa de estímulo ao modal.

O secretário nacional de Hidrovias e Navegação (SNHN), Dino Antunes Batista, diz que o ministério pretende colocar a minuta das embarcações sustentáveis ​​em consulta pública em agosto e publicar uma portaria durante a COP30, em novembro, em Belém (PA). “Já discutimos os elementos desta portaria com armadores, trabalhadores e usuários. Fizemos uma discussão ampla e esperamos que, em agosto, consigamos abrir consulta pública sobre ela”, estima Batista.

Na avaliação do secretário, o decreto vai trazer mais segurança jurídica e agregar à sustentabilidade ambiental e social do setor de cabotagem. Ele destaca que a descarbonização e a sustentabilidade são temas importantes no setor de navegação, que estão alinhados às regras em discussão na IMO e que voltam à pauta da agência da ONU em outubro. “Conseguimos trazer o elemento da sustentabilidade de forma interessante no decreto e talvez tenha sido esse elemento que serviu de aglutinador para nos apoiar muito nas discussões que tivemos com os diversos envolvidos”, diz Batista.

Em relação aos combustíveis marítimos, o MPor tem conversado com o Ministério de Minas e Energia (MME) e a Marinha do Brasil, que por meio de suas representações junto à IMO está à frente das discussões internacionais sobre a descarbonização do setor marítimo. Batista conta que, provavelmente, o ministério não vai entrar em detalhes do combustível na portaria de embarque sustentável porque ainda existe uma ampla discussão no mundo sobre esse assunto.

Ele pondera que, apesar dos detalhes não especificados, os biocombustíveis terão espaço na norma. “Já garantimos claramente que os biocombustíveis, como o etanol, farão parte da análise que vai entrar na portaria de embarcações sustentáveis. Ele é um dos elementos que estão sendo considerados”, revela Batista.

Ele acrescenta que o decreto do BR do Mar foi construído visando a sustentabilidade, tanto pelo lado ambiental, quanto pelo social, considerando as demandas da tripulação. “Esses dois elementos são importantes, mas essa questão dos combustíveis entra também na discussão”, explica Batista.

O secretário, que também esteve presente na 60ª Nor-Shipping, relata que a descarbonização foi destaque na edição do evento e que, no Brasil, o Conselho Diretor do Fundo da Marinha Mercante (FMM) aprovou prioridade para embarcações que utilizam combustíveis sustentáveis, inclusive os novos navios da Transpetro, cujos editais preveem o uso de insumos menos ecológicos do que os atuais. Batista acrescenta que a navegação interior também é um segmento que está envolvido nessa discussão de sustentabilidade.

No final de julho, o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) e a Transpetro negociaram um acordo de cooperação técnica para a elaboração de estudo sobre as oportunidades de descarbonização e de transição energética para a reestruturação da indústria naval. O trabalho buscará identificar oportunidades de fortalecimento do setor naval no país no contexto das ações de redução de emissões geradas pelo transporte marítimo e pela construção naval.

O documento vai mapear a indústria nacional, os mercados e as políticas industriais internacionais voltadas para a indústria naval. Além disso, fará a identificação de fatores produtivos e tecnológicos do setor frente à descarbonização e às questões geopolíticas. Também serão observadas questões relativas à modernização da infraestrutura portuária e apresentações proposições para melhorias e sugestões para novas políticas públicas.

A nova geração de navios que transportam minério para a Vale, classe Guaibamax, tem previsão de entregas para incorporação à frota dedicada à companhia para o período de 2027 a 2029. O pacote afretado pela mineradora tem um total de 10 Very Large Ore Carriers (VLCCs) que serão construídos em estaleiro na China pelo armador que venceu uma concorrência internacional. As embarcações serão 14% mais eficientes que a geração atual, com até 90% de redução de emissões de GEE, considerando o uso de metanol como combustível.

Esses navios mineraleiros, com 325 mil toneladas de capacidade, poderão atracar nos terminais portuários da Ilha da Guaíba (RJ), Tubarão (ES) e Ponta da Madeira (MA). O diretor de navegação da Vale, Rodrigo Bermelho, afirma que o pacote terá o ‘estado da arte’ de tecnologias de redução de emissões, aproveitando os avanços de soluções já inovadoras e que vêm sendo aprimoradas em outras embarcações da frota da companhia.

“Fizemos um esforço, a partir do nosso projeto de pesquisa, de incorporar todas as tecnologias que deram resultados positivos, com vistas à eficiência energética e também a nossa estratégia de avanço na utilização de combustíveis alternativos, nesse modelo de dar o primeiro passo, mas manter as opções abertas para uma mudança no futuro”, disse Bermelho.

Ele acrescenta que a Vale faz mais de mil embarques por ano, exportando 300 milhões de toneladas. “Esses navios vêm a adicionar uma camada de contratos de uma parte do transporte das 300 milhões de toneladas”, explica o diretor.

No mesmo evento, o grupo CBO anunciou a assinatura de uma parceria com a Caterpillar/MaK que visa a conversão de motores para o uso de etanol em embarcações de apoio marítimo. De acordo com a CBO, será um projeto-piloto no Brasil, com a expectativa de que a solução esteja pronta para operar com esse biocombustível em 2026. A empresa enxerga uma série de vantagens do etanol em comparação com outros combustíveis, por exemplo, em termos de volume necessário para equivalência ao diesel.

“Estamos orgulhosos e liberados com este projeto, que é um grande processo. O financiamento dele está disponível. É a primeira vez que o FMM [Fundo da Marinha Mercante] financia um projeto de energia do Brasil. (…) Acreditamos que o etanol é uma boa solução”, disse o diretor da CBO, Marcelo Jorge Martins.

O projeto recebeu prioridade de financiamento na 56ª reunião do Conselho Diretor do Fundo da Marinha Mercante (CDFMM), em setembro de 2024. Na ocasião, foi aprovada prioridade de R$ 47,3 milhões para a CBO desenvolver um projeto de pesquisa e desenvolvimento (P&D) a motor de combustão a etanol, no estaleiro do grupo (Aliança), no Rio de Janeiro. Os valores têm base de dados em janeiro de 2024.

A Sotreq, representante da Caterpillar, ressalta que o desempenho do motor será o mesmo de um motor a combustão. “O grande ganho em utilizar o etanol como combustível é na redução das emissões de gases de efeito estufa. Substituir o diesel (combustíveis fósseis) pelo etanol produzido pela cana-de-açúcar pode alcançar reduções de 80% a 90% do CO2eq”, estima o gerente de motores e desenvolvimento de mercado da Sotreq, Rodrigo Feria.

A Sotreq está disponível para ser o primeiro embarque no mundo com esse tipo de solução, que é considerado inovador e de grande potencial. “É inovador pelo fato de se tratar de uma conversão de um motor que foi concebido para operar apenas com diesel e agora será capaz de operar com uma mistura de diesel e etanol”, destaca Feria.

Um fornecedor acredita que o uso do etanol é promissor para as empresas do setor que estão comprometidas em reduzir o nível de emissões de GEE e alinhadas com os compromissos da IMO, principalmente no Brasil, onde há uma cadeia de produção e distribuição bastante desenvolvida e que ainda tem um potencial enorme a ser explorado. “Acreditamos que o etanol será um importante aliado das empresas no processo de descarbonização pelo seu teor sustentável e acessibilidade no Brasil”, projeta o gerente da Sotreq, que também participou da feira.

O Centro Nacional de Navegação Transatlântica (Centronave), que reúne 19 armadores de atuação mundial e que operam no transporte marítimo de longo curso no Brasil, enxerga a transição energética como uma jornada longa e complexa, com muitas tecnologias em estudo. Um dos desafios é que, sem levar em consideração a questão das emissões, petróleo e derivados são muito eficientes energeticamente falando.

“Acredito que, durante muito tempo, ainda existirão navios movidos exclusivamente a combustíveis fósseis pagando sobretaxa para compensação. Mas essa velocidade de transição vai aumentar”, considera o diretor executivo da Centronave, Cláudio Loureiro. Um conceito que deve evoluir, segundo ele, é dos navios dual fuel.

Ele classifica o período como interessante e de várias alternativas concomitantes, já que hoje ainda não existe uma tecnologia dominante. O diretor executivo da Centronave acredita que as tecnologias ainda avançarão, permitindo que os navios se movam por mais de um combustível. A leitura é que existe uma frota que ainda durará 20 anos. “Vai ter uma mistura e vai diminuir [essa quantidade de] navios movidos a combustíveis fósseis. Mas eles vão continuar a existir, pagando uma taxa. É uma transição lenta”, projetou Loureiro.

Outras apostas diminuem a emissão de carbono passam pela adoção de velas rotativas, limpeza de cascos de navios com robôs, entre outras soluções. “Além da questão do combustível, os armadores estão buscando muitas soluções para diminuir o próprio consumo. Alguns estão construindo navios movidos a metanol e por outro lado investindo na produção de metanol verde. Os armadores estão buscando sua solução porque sabem que não vai cair do céu”, analisa Loureiro.

Se por um lado as novas soluções estão em desenvolvimento, há uma preocupação dos armadores com a disponibilidade de abastecimento de combustíveis. O Centronave alerta para a necessidade de investimentos em infraestrutura para que os portos se preparem para os resultados do MEPC, que entrarão em vigor em 2027.

O risco identificado é que a carência possa, no longo prazo, representar o encarecimento do transporte marítimo brasileiro com o pagamento das taxas de emissão de carbono que serão estipuladas globalmente. “Provavelmente, se não houver esse aprofundamento dos portos e capacidade de receber navios a combustíveis alternativos, o comércio exterior brasileiro vai continuar sendo feito por navios movidos a combustíveis fósseis e pagando taxa”, aponta Loureiro.

Para a Centronave, o conceito de corredor verde está mais ligado ao transporte de cabotagem e merece ser aprofundado. Loureiro acredita que uma possibilidade seria montar, a princípio, uma rede de abastecimento de etanol produzida no Brasil ao longo da costa para abastecer navios de cabotagem. Ele explica que é mais difícil para o longo curso porque o navio enfrentou um trânsito de 35 a 40 dias do Brasil até a China, por exemplo, sem falar de não poder ter essa estrutura de abastecimento com combustível brasileiro no Extremo Oriente. O diretor executivo da Centronave lembra que a facilidade do etanol como combustível alternativo foi uma brigada da delegação do Brasil na IMO.

“Acho que é possível esse corredor verde, mas para a cabotagem. Todos os armadores estão buscando seus caminhos. Não existe um combustível obrigatório, um combustível que tenha preferência. Há um movimento hoje mais próximo de abastecimento com gás liquefeito de petróleo, que é combustível fóssil, mas já diminuiu em mais de 20% a emissão de CO2. Já tem um ganho, porque se vê que o mundo não tem infraestrutura de combustível. É um combustível de transição”, diz Loureiro.

Ele observa que continuam as encomendas de conteineiros movidos para a GNL, mas entende que haverá uma transição mais acelerada a partir de 2030 e 2040. “Dependendo do grau de maturação da estrutura de abastecimento, vai haver uma transição nas encomendas. O problema é que um navio dura 15 a 20 anos. Como vai se fazer?”, indaga Loureiro.

A Associação Brasileira dos Armadores de Cabotagem (Abac) vem trabalhando em conjunto com o Conselho Nacional de Política Energética (CNPE) e o Ministério de Portos e Aeroportos para que os portos tenham disponibilidade de combustíveis mais limpos para os navios de cabotagem. O diretor executivo da Abac, Luis Fernando Resano, observa que vem se falando muito sobre corredores verdes com ótica de longo curso, mas que existem iniciativas por parte da cabotagem no Brasil.

“Ainda não batizamos, mas estamos trabalhando em algo que diga que um trecho da costa é coberto com navios operando na cabotagem com requisitos verdes. Basicamente, é o que a gente considera abastecidos com biocombustíveis, ou seja, combustíveis sustentáveis”, revela Resano. Segundo ele, o etanol é uma opção, talvez para o futuro, considerando o desenvolvimento do combustível (B100) e a possibilidade de abastecimento na costa brasileira.

Entretanto, uma preocupação das empresas de navegação é em relação ao custo desse combustível ser bem mais alto do que o bunker. “Precisamos combinar e tratar, seja com os produtores de combustível, seja com o governo, uma maneira de isso não impactar qualidades na cabotagem, ou seja, que atraia cargas para a cabotagem, e não faça com que as cargas hoje na cabotagem migratória para o rodoviário”, ponderou Resano. 

O diretor-presidente da Log-In, Marcio Arany, diz que a Abac tem apoiado e acompanhado de perto a delegação brasileira com estudos e discussão importantes relacionadas à regulamentação na IMO, que estabelece os níveis de emissão de gás carbônico ao longo do tempo. Ele observa que o Brasil, enquanto nação, precisará se posicionar porque existem questões relacionadas à cadeia de fornecimento de combustível.

“É um desafio porque o país é visitado por navios do mundo inteiro. Então, tem que estar em linha com corredores que estão sendo desenhados no mundo nas rotas mundiais. Aqui na cabotagem precisamos definir um corredor verde ao longo da costa onde tenhamos capacidade de abastecer nossos navios com esses combustíveis verdes”, sugere Arany.

Fonte: Revista Portos e Navios